Artigo: Furto em condomínio - quem paga o prejuízo?

Wanderson de Oliveira

Há responsabilidade do condomínio por furto de objetos dos condôminos deixados em garagem? 



Da Responsabilidade civil e do dever de indenizar. A chamada de cláusula geral da responsabilidade civil está prescrita no art. 186 do Código Civil nos seguintes termos: 

“Aquele que, por ação ou omissão, voluntária, negligencia ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito." 

Já o dever de indenizar está no artigo 927: 
“Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. 
São elementos essenciais para que se configure a responsabilidade do agente causador do dano: (i) um ato danoso, seja por ação ou omissão, (ii) nexo de causalidade entre o ato e o dano e o (iii) existência do dano. 

A responsabilidade civil se divide ainda em objetiva e subjetiva. Na objetiva não há necessidade de a vítima provar a culpa/dolo de um ato ilícito seja por ação ou omissão do causador do dano, basta apenas provar qual foi o dano sofrido e a relação (nexo) dele com as ações do ofendido. Exemplo: A empresa, por seus empregados, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele. Neste caso cabe ao ofensor provar que não cometeu ato ilícito seja por ação ou omissão. 

Na subjetiva a vítima deve, além do dano e do nexo, comprovar a culpa/dolo do ofensor. Exemplo: Erro médico. A vítima deve provar a culpa do médico. Neste caso o dever de indenizar dependerá da prova produzida pela vítima. 

A culpa, elemento importante para caracterizar o direito de indenizar, pode ser avaliada sobre o prisma da negligência, imprudência e/ou imperícia. 

Importante jurista da matéria nos ensina que “A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.” Maria Helena Diniz (DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003). 

Feita esta pequena introdução, na sequência para uma melhor compreensão faremos uso de exemplo hipotético. 

Caso hipotético
Morador encaminha pleito de ressarcimento de prejuízos no valor de R$ 3.950.000,00 em razão de furto de sua Ferrari 812 Superfest ano 2018 que se encontrava em garagem de sua propriedade. Informa que teve acesso as imagens do circuito de segurança, meio pelo qual confirmou o evento. 

O condomínio do caso hipotético tinha porteiro terceirizado, a convenção ou regimento interno sem previsão de ressarcimento de danos materiais e nem cláusula de indenização, o condomínio não possui vigilância e segurança contratados e o seguro contratado não abrange danos materiais e objetos em vagas de garagem 

O condomínio deve ressarcir o morador prejudicado com o furto de seu veículo? 

Resposta a indagação 
O condomínio é um ente com personalidade “sui generis”, ou seja, não possui personalidade jurídica tal como uma empresa, mas responde por obrigações, inclusive por atos cometidos por empregados do prédio, próprios ou terceirizados, conforme o caso. 

Em geral, porém, o condomínio não assume responsabilidade por objetos furtados em suas dependências, principalmente no interior das unidades autônomas (apartamento, garagem etc.), assim, não se poderia exigir dele e dos demais condôminos indenização por obrigações que são comuns. 

A jurisprudência dominante não tem reconhecido o dever de indenizar do condomínio, exceto se expressamente previsto na convenção ou regimento interno tal dever, visto que o prejuízo sofrido por um condômino oneraria aos demais. Assim, é inexistente o dever de guarda e vigilância de bens particulares, para essa corrente. 

Toda regra comporta exceção, assim, se comprovada a culpa (negligência, imprudência ou imperícia) ou então quando assume para si a guarda e vigilância de bens particulares, o condomínio pode ser responsabilizado. Por exemplo, nos casos em que há expressa previsão em convenção, regimento interno ou aprovação em assembleia. Independentemente disto, também quando disponibilize serviços de vigilância e segurança, presença de câmeras de vigilância, cercas elétricas etc. 

Por oportuno, colacionamos julgados nos dois sentidos: 
Excluindo a responsabilidade do condomínio: 
“EMENTA: CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONDOMÍNIO. O condomínio só responde por furtos ocorridos nas suas áreas comuns se isso estiver expressamente previsto na respectiva convenção. Embargos de divergência não conhecidos. (STJ, 2ª Seção, Relator Min. Ari Pargendler, EREsp 268669 / SP; Embargos de Divergência no Recurso Especial n º 2001/0162676-0, DJ
26.04.2006 p. 198).

“EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL. CONDOMÍNIO. FURTO DE MOTOCICLETA. GARAGEM. Não há responsabilidade do condomínio se este não assumiu expressamente em sua convenção a obrigação de indenizar os danos sofridos pelos condôminos, decorrentes de atos ilícitos ocorridos nas áreas comuns do prédio. Precedente. Recurso conhecido
e provido.” (STJ, 4ª Turma, Relator Min. Aldir Passarinho, REsp 268669 / SP; Recurso Especial 2000/0074531-6, DJ 01.10.2001 p. 222 RT vol. 798 p. 225).

“EMENTA: INDENIZAÇÃO. CONDOMÍNIO. FURTO OCORRIDO EM GARAGEM DE EDIFÍCIO. O condomínio é responsável pela indenização de motocicleta furtada em sua garagem, se demonstrada sua culpa in vigilando. Apelo conhecido, mas improvido". (TJGO, 1ª. Câmara Cível, Relator Des. Castro Filho, Apelação Cível nº 40154-0/188, DJ 12426 de 04/11/1996). 

Admitindo a responsabilidade do condomínio:  
Todavia, o caso dos autos pode ser reconhecido como uma exceção ao que vem sendo amplamente difundido pela jurisprudência pátria, posto que, embora haja expressa exclusão da responsabilidade prevista no Regimento Interno do condomínio apelante, o fato é que este disponibiliza serviços de vigilância e segurança aos condôminos, cobrando, para tanto, taxa específica para seu custeio, como provam os documentos de fls. 23/27, além da presença de câmeras de vigilância, as quais captaram o momento do furto (fls.30).
“Não haveria razão alguma para tanto custo com segurança se, ao final, o condomínio não tivesse nenhuma responsabilidade por incidentes com bens dos condôminos. Seriam verbas utilizadas desnecessariamente, em franca sangria aos recursos regiamente rubricados e captados com sacrifícios de cada um dos residentes.” (fls. 339) (Apelação Cível nº 344594-61.2011.8.09.0051 (201193445949) – 13.11.2014

NEGLIGÊNCIA DO FUNCIONÁRIO RESPONSÁVEL PELA GARAGEM. RESPONSABILIZAÇÃO DO CONDOMÍNIO. DANO MORAL IN RE IPSA. RECURSO DA LITISDENUNCIADA. TERMO INICIAL PARA INCIDÊNCIA DE JUROS DE MORA. RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 54 DO STJ. PEDIDO DE AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. LITISDENUNCIADA QUE RESISTIU À PRETENSÃO DO AUTOR. Em decorrência da proteção da legítima expectativa, corolário do princípio da boa-fé objetiva, o condomínio assume para si a responsabilidade de guarda e vigilância da propriedade de seus condôminos, tornando irrelevante qualquer previsão de não responsabilidade constante em convenção condominial. Condomínio réu que possui: sistema de vigilância por câmeras; funcionários responsáveis por rigoroso controle da entrada e saída dos veículos; contrato de seguro com cobertura de responsabilidade civil garagista por roubo e furto. Responsabilidade pela guarda e vigilância dos veículos. Presença dos elementos da responsabilidade civil. Dano moral in re ipsa.” Precedente Citado: TJRJ AC 2008.001.23230, Rel. Des. Celio Geraldo M. Ribeiro, julgada em 17/12/2008

“RESPONSABILIDADE CIVIL. CONDOMÍNIO. FURTO DE BRINQUEDO NA GARAGEM CONDOMINIAL. (...) O que determina a responsabilidade do Condomínio ou Associação de Moradores de Loteamento Fechado pelo furto é a obrigação que assume de vigilância e segurança, provando-se nesse caso a falha no serviço. No caso, não estão presentes estas duas condições para responsabilizar o réu. Portanto, não há fundamento legal ou convencional para o acolhimento do pedido dos autores, de modo que a sentença, que julgou improcedente o pedido, deve ser mantida por seus próprios fundamentos. Sentença de improcedência do pedido mantida. Recurso não provido.” (TJ-SP - APL: 02177683420098260100 SP 0217768- 34.2009.8.26.0100, Relator: Carlos Alberto Garbi, Data de Julgamento: 20/05/2014, 10ª Câmara de Direito Privado 
Por fim, é importante que o síndico e condôminos, em Assembleia, definam qual é o melhor caminho e intenção de todos. Indenizar ou não o prejuízo, passa pela necessidade de inserir a previsão em Convenção, observando o quórum legal para aprovação/alteração. Importante também observar se o condomínio assume algum dever de vigilância sobre os bens dos condôminos ou, ainda, se no caso concreto há culpa do condomínio pelo fato danoso, o que pode ensejar o direito de indenizar independentemente de previsão em Convenção. 

*Wanderson de Oliveira é Advogado em Goiânia-GO, presidenta da seccional Goiás da ABRASSP - Associação Brasileira de Síndicos Profissionais e membro do Instituto Nacional de Direito Condominial - https://drwandersondeoliveira.blogspot.com/ - woadv.go@gmail.com

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